1.2.15

Eduardo Guimarães: "Desejo"




Desejo

Desejo, desejo vago
de ser a tarde que expira,
ser o salgueiro do lago,
onde a aragem mal respira.

Ser a andorinha que voa
e vai, ser o último raio
de sol... e o sino que soa.
Ser o frescor do ar de maio.

Ser o eco da voz distante
que além se extingue dolente
ou essa folha que, errante
ao vento, cai dormente...

Ser o reflexo disperso
dum ramo n'água pendido,
fluído e belo como um verso
que cante mas sem sentido!

Ser o silêncio, esta calma.
Breve momento impreciso.
Ser um pouco da tua alma...
um pouco do teu sorriso.


GUIMARÃES, Eduardo. A divina quimera. Porto Alegre: Livraria do Globo, 1944.

4 comentários:

ADRIANO NUNES disse...

Cicero,

que poema belo! grato por compartilhá-lo! Viva!


Abraço forte,
Adriano Nunes

Anônimo disse...

Cicero,

O entusiasmo do Adriano Nunes (poeta e tradutor) diz tudo. Você resgata poetas e poemas que - infelizmente - dormem no limbo. O Eduardo Guimarães, uma espécie de "simbolista tardio", (em termos de "escola poética")contemporâneo de outro poeta perdido, o grande poeta carioca Raul de Leoni, posto que ambos viveram em meio a essa época turva de transição que literatura brasileira experimentou entre 1900 até 1922. Neste semana que já foi e foi tarde, um acalanto para um leitor de poemas, apenas leitor, como eu, que fico a imaginar a hipótese maravilhosa se você pudesse preparar e organizar uma antologia nestes moldes: poetas injustamente postos à margem do esquecimento como José de Albano, Eduardo Guimaraes, o próprio Raul de Leoni, Amadeu Amaral, Múcio Leão, Da Costa e Silva (pai do poeta Alberto da Costa e Silva) e tantos outros. Do José de Albano, que nos legou esta pérola:

Poeta fui e do áspero destino
Senti bem cedo a mão pesada e dura.
Conheci mais tristeza que ventura
E sempre andei errante e peregrino.
Vivi sujeito ao doce desatino
Que tanto engana, mas. tão pouco dura;
E ainda choro o rigor da sorte escura,
Se nas dores passadas imagino.
Porém, como me agora vejo isento
Dos sonhos que sonhava noite e dia,
E só com saudades me atormento;
Entendo que não tive outra alegria
Nem nunca outro qualquer contentamento
Senão de ter cantado o que sofria.

Antonio Cicero disse...

Obrigado, Arsenio. É uma boa ideia, a dessa antologia. Infelizmente, estou tão ocupado, tentando finalizar um livro de ensaios, que não me seria possível. Mas por que você mesmo não faz essa antologia? Seria ótimo!

Adoro o poema do José de Albano que você trouxe e, na verdade, já até o havia postado, em 2011, aqui: http://antoniocicero.blogspot.com.br/search/label/Jos%C3%A9%20Albano.

Abraço

Anônimo disse...

Obrigado, Cicero!
Eu bem que desconfiava que o José de Albano não havia passado em brancas nuvens por aqui. De toda sorte fica sugestão para o Adriano Nunes e os demais Poetas e pessoas legadas ao ofício inebriante das letras que frequentam o blog, o que não é o meu caso (daí a minha patente insegurança.) Vou coligindo poemas, e se alguém precisar, é só pedir, que terei a satisfação em ajudar.
Abraços a todos
Arsenio Meira Junior
Ps - Já estou no aguardo do seu livro de ensaios!